Jean Montezuma,
de Salvador.
Mais uma vez a chuva caiu forte em Salvador e região
metropolitana. Nas últimas 24 horas, segundo o INEMA, o índice de precipitação
foi bem elevado em Salvador com marcas de 99,9mm em Águas Claras, 86,9mm na
região do Alto do Peru, chegando a 108,1mm em Pirajá. Já em Lauro de Freitas e
Candeias choveu 82mm. Esse ano a temporada de chuvas, período de março a junho,
veio mais forte e a previsão para o final de semana é de mais chuva em toda a
RMS.
Toda vez que a chuva cai o drama maior na cidade tem raça,
classe e endereço. As mais de 600 áreas de risco mapeadas somente na capital
localizam-se em sua esmagadora maioria na periferia, em regiões como o subúrbio
ferroviário ou os bairros de São Caetano e região. São negras as 19 novas
vítimas fatais soterradas nos deslizamentos, são famílias negras trabalhadoras
que perderam suas casas ou, as que ainda se mantém nelas mesmo sob condições de
risco pelo simples fato de não ter para onde ir. É negro o drama vivido nas
madrugadas chuvosas como a que tivemos ontem.
Essa terrível situação poderia ser superada se houvesse da
parte da prefeitura e do governo do Estado vontade política de resolver o
problema. O jornal Folha de São Paulo denunciou em seu site que só no período
entre 2007 e 2015 R$2,3 bilhões foram disponibilizados pelo ministério das
cidades para obras voltadas para contenção de encostas e prevenção de
deslizamentos. Contudo apenas 15% desse valor, R$340 milhões, foi executado. Para
que se tenha uma ideia, somente a
reforma do estádio da Fonte Nova teve um custo total de R$591 milhões.
Na Bahia o governo do Estado e a prefeitura captaram juntos R$176
milhões, porém, executaram em obras apenas 4% desse valor. Em maio de 2014 o
ex-governador Jaques Wagner (PT) lançou um Programa
estadual de prevenção a desastres naturais que previa a contenção de 98
encostas, no entanto, apenas seis obras foram concluídas. Já o prefeito ACM
Neto (DEM), que recebeu recursos para 20 obras de contenção, concluiu apenas
duas!
A falta de iniciativa na elaboração de projetos ou a
morosidade na condução das poucas obras que chegam a etapa de execução são
exemplos do desinteresse político. Aliás, essa é uma infeliz tradição seguida
por todos os governadores e prefeitos desde ACM, o avô, passando por Paulo
Souto, Imbassahy, João Henrique, até Wagner. ACM Neto e Rui Costa tiveram com
quem aprender. Quem paga caro por isso é a população.
O secretário de infraestrutura de Salvador, Paulo Fontana,
rebateu a denúncia da Folha de São Paulo alegando que o problema dos atrasos é a
burocracia. Perguntamos então ao secretário, ao prefeito Neto e ao governador
Rui Costa: Por que essa burocracia nunca é problema na hora de gastar milhões
com obras como as da Copa do mundo? Por que será que quando o assunto são as
obras e intervenções que podem trazer benefícios reais aos trabalhadores sempre
surge a “burocracia” para impor barreiras? Da mesma forma que não podem
simplesmente culpar as chuvas, Neto e Rui também não podem acusar a burocracia
para se esquivarem de suas responsabilidades. Não, nenhum dos dois tem esse
direito.
As vidas perdidas e o drama das encostas são o resultado da
completa ausência de um planejamento urbano que responda aos problemas
estruturais e que privilegie o bem-estar da população em detrimento do lucro da
especulação imobiliária. Por isso não aceitamos as desculpas e também por isso denunciamos
a hipocrisia das declarações concedidas pelos gestores nas entrevistas
coletivas. O povo que vive o drama das encostas e que se desespera quando a
chuva cai não quer mais desculpas, já estão cansados disso, assim como já estão
cansados de chorar morte de entes queridos ou ver suas casas vindo abaixo.
Salvador precisa de uma verdadeira reforma urbana que vá a
fundo nas mudanças necessárias para superar o atual estágio de calamidade. De
imediato é preciso reforçar as medidas de emergência para acolher as famílias
desabrigadas ou que se encontram em situação de risco. Ao invés de dar
desculpas, essa deve ser a prioridade da prefeitura e do governo do Estado.
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