Lucas Dantas, Salvador (BA)
Ocorreu ontem, 26/02, pela manhã no auditório da sede
OAB-BA a audiência pública “Ações da
RONDESP no Cabula: Limites para uso da força da polícia militar” motivada
pelo recente caso da chacina na comunidade de Vila Moisés no bairro do Cabula.
A audiência atraiu um imenso público, retrato da enorme repercussão que as
mortes causadas pela ação da RONDESP provocaram e o clamor da sociedade por um
debate que aponte caminhos para superar o atual quadro das políticas de
segurança pública.
O auditório da OAB ficou pequeno, cerca de 600 pessoas
estiveram presentes. Na mesa de debate representantes da OAB, da defensoria
pública, do ministério público, do governo do Estado, associações de policiais
civis, parlamentares e Hamilton Borges, coordenador da Campanha REAJA. No
auditório lotado se fizeram presentes também muitos ativistas de diversos
movimentos sociais, em especial do movimento negro.
Também havia um grande número de policiais presentes,
o que contribui para gerar um clima de tensão durante toda audiência. Lamentavelmente
não houve da parte dos policiais que se encontravam no plenário o
reconhecimento “mínimo” de que uma ação que resulta na morte de 13 jovens não
pode ser defendida, muito menos naturalizada. Ao contrário, em diversos
momentos atuaram como verdadeiros provocadores interrompendo falas, ameaçando
ativistas, sendo que alguns sentiam-se a vontade pra gritar: “Vocês são contra
a polícia porque são todos maconheiros vagabundos”!
Uma política de segurança falida.
A ampla maioria das falas durante toda a audiência
convergiram num sentido: A atual política
de segurança pública está esgotada, não apenas porque é incapaz de conter a
violência mas, na verdade, através de sua lógica de guerra e modelo
militarizado de polícia promove a violência. A isso soma-se a ideologia
racista que está no DNA dos órgãos de controle social no Brasil desde os tempos
da escravidão fazendo do povo negro o grande alvo, um “inimigo” a ser eliminado
numa guerra montada pelo próprio estado brasileiro contra aqueles que
representam a maioria da população.
Nessa guerra, ou melhor, nesse extermínio diário que o
Estado brasileiro promove, as baixas de ambos os lados possuem a mesma cor. Em
especial na cidade de Salvador onde mais de 80% da população é negra, o
policial que vai até a periferia e tira a vida de jovens negros, na ampla maioria
dos casos também é negro e morador de periferia. Nesse ponto concordamos com o
coordenador da Campanha REAJA Hamilton Borges quando diz que “policiais não podem sair de suas casas em
locais pobres para combater pessoas que parecem com eles”.
João Jorge Rodrigues, presidente do Olodum, também
usou da fala para denunciar o que chamou de “modelo nazista de policia militar”
baseado no tripé “isolar, identificar e eliminar”. Ele também relembrou o
histórico de membros da entidade que foram perseguidos e assassinados pela
polícia. Já a professora Vilma Reis dirigindo-se aos policiais militares, que
no fundo do plenário faziam provocações a todo momento, disse que “as armas não brotam nas comunidades, as
balanças de precisão não brotam nas comunidades, e os helicópteros repletos de
cocaína também não brotam nas comunidades”. Em seguida denunciou, assim
como inúmeras outras falas fizeram, as declarações do governador Rui Costa e do
secretário de segurança pública Maurício Barbosa.
Desmilitarizar é preciso.
Na Bahia e no Brasil a postura histórica do Estado
através dos seus diversos governos e regimes foi a do abandono das periferias e
criminalização dos mais pobres. O Estado que se ausenta frente a
responsabilidade de promover educação, saúde, moradia digna, cultura e emprego
só se faz presente na periferia através do braço armado da polícia.
Infelizmente após 12 anos de governos petistas o Brasil continuou sendo um dos
países mais desiguais do mundo, e é justamente essa desigualdade que promove as
injustiças sociais que devem ser combatidas se quisermos de fato buscar uma
saída para violência.
O governador Rui Costa já demonstrou que pretende
manter a lógica da repressão. Com uma mão o governador pretende cortar mais de
200 milhões de reais do orçamento da educação e com a outra sinalizou a
pretensão de gastar mais de 300 milhões com o projeto de criação da BOPE
baiana. Não há outro caminho para o movimento negro baiano que não seja o do
enfrentamento com a política de segurança pública posta em prática pelo governo
petista. É preciso romper com essa lógica de guerra.
Uma vez mais reivindicamos a fala feita na audiência
por Hamilton Borges quando disse que “Nós queremos
o fim da Polícia Militar, porque nós queremos que os policiais tenham direito à
greve, que os policiais não se submetam a uma casta de oficiais, que estão
‘muito bem, obrigado’, enquanto os policiais vão para guerra”. Para conter a escalada da
violência e dar um basta ao genocídio da juventude negra a desmilitarização da
polícia, o fim dos “Autos de resistência”, a criação de corregedorias externas
e a extinção de batalhões especiais como a RONDESP e o BOPE são medidas
necessárias.
O PSTU se soma as organizações e aos diversos
ativistas que exigem do governo garantias de que haverá uma investigação ampla
e rápida, se necessário for, federalizada, para que todos os envolvidos nessa
chacina sejam devidamente julgados e punidos. Enquanto isso não podemos recuar
nenhum único centímetro, os movimentos devem se manter em luta organizando
atos, promovendo debates, fazendo de tudo para ampliar o alcance da luta contra
o genocídio e em defesa da vida da nossa juventude negra.
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